o adolescente de hoje

O adolescente de hoje: que fruto estamos dando ao mundo?

by Xila Damian

Adolescente de hoje

Certamente já escutou ou usou a frase para se referir à juventude atual. Por meio dela, conscientemente ou não,  também já mostrou sua percepção negativa e, na maioria das vezes, superficial, sobre o jovem “de hoje”; como muitos, quiçá já torceu o nariz a filho adolescente por sua “irritante” – ainda que esperada – imaturidade e principalmente por seu censurável perfil “de hoje”.

Confesso: participei deste grupo de contumazes críticos ao adolescente dito “de hoje”.  Porém, ao julgá-lo, um detalhe insistia em me incomodar: quem originalmente é responsável por formar filho adolescente senão seus pais?

Adolescente de hoje continua sendo fruto de uma semeadura iniciada cedo.  A cada etapa deste longo processo de desenvolvimento, nos é exigido cultivo alinhado às necessidades da fase e das circunstâncias vigentes. Então? Como estamos nos capacitando para atender às expectativas de dar bom fruto ao mundo?

Pais no mundo de hoje

Mãe no automático, caí no simplismo de rotular filho adolescente. Ocupada em definir sua geração, adotei o termo “adolescente de hoje” para descreve-lo e assim facilitar a leitura sobre o que, na verdade, desconhecia.  Não percebia, contudo, que enquadrando-o ao padrão “de hoje”, ignorava sua identidade, personalidade e desmerecia a nova era.

Misturado em massa impessoal, tachei filho de típico adolescente de hoje destacando os defeitos da nova geração e me cegando às suas virtudes. Assim aliviava meu trabalho – e dever – de efetivamente conhece-lo e, junto, disfarçava a preguiça e o desinteresse de saber sobre sua vida.

Logo a incompetência materna ficou evidente: viver a nova fase junto de filho adolescente sob novas circunstâncias do mundo atual virou desafio a princípio impossível de ser vencido. Adicionalmente contaminada por duras leituras e pessimistas discursos sobre o adolescente de hoje, assumi comparações simplistas em que o presente sempre perdia por grande demérito para o passado inexistente.

Elencando razões externas para justificar o péssimo – e a certa altura nulo – relacionamento com filho adolescente, paulatinamente me eximia da responsabilidade de formar adulto (diferente sim) para o mundo de hoje, e ainda assim necessitado de pais presentes – e competentes – para ajuda-lo a ser adolescente de hoje.

Pais dispostos e corajosos para o cultivo

Não raro escutar, concordar – e até repetir! – críticas ao adolescente de hoje.  Infladas declarações negativistas, acompanhadas de notória aversão ao mundo atual, reiteradamente desqualificam toda uma geração de jovens e nós, pais, conscientes ou não, vamos nos cegando ao desvario de atacar filho sem notar nossa pífia atuação neste contexto.

Valendo-nos dos tradicionais clichês sobre a fase e rasos rótulos sobre este mundo totalmente diferente, reduzimos nossa responsabilidade de desbravar o desconhecido, delegando a terceiros culpas por nosso medo, inércia e até preguiça de aprender um cultivo diferente do passado.

Conviver com o adolescente e o mundo de hoje demanda disposição e coragem para assumir a missão com  responsabilidade mas de forma diferente do passado; requer efetivamente conhecer a fase e o filho com propriedade não para definir e controlar mas para se relacionar e ajuda-lo a se tornar a melhor versão de si mesmo para o mundo atual.

Pais agricultores

De longe não conseguimos preparar terreno algum. É preciso meter a mão na massa, conhecer e se envolver com a terra, descobrir meios de cultivo eficazes para frutificar.  A experiência ajuda mas não é garantia de sucesso especialmente sob circunstâncias tão diferentes como as atuais.

O terreno é outro; mudou. Não há mais trilhas; no máximo vestígios de um caminho trilhado mas não mais certeiro o que nos força, como pais agricultores, a tomar a dianteira e desvendar novos caminhos capazes de nos render bons frutos. Nesta nova empreitada, atualizar-se é condição sine qua non.

Dar crédito à depreciativa retórica sobre adolescente de hoje é, antes de tudo, atestar nossa ignorância e displicência diante da missão de criar filho para o mundo.  Seria só mais um conflito de gerações não fosse clara evidência de negligente preguiça esquecer a fundamental atuação dos pais neste delicado – e complexo – processo de desenvolvimento de outro ser para este mundo, não passado.

Os pais do mundo de hoje

Peguei atalhos como mãe usufruindo de experiências alheias. Reinventar a roda seria um desperdício de tempo e energia, certo? Mas os sérios conflitos com filho adolescente de hoje me forçaram a desbravar caminho próprio.  As significativas mudanças do perfil e do mundo de hoje me obrigaram a abandonar o modelo passado para viver o presente de outra forma.  

Experimentei outras dinâmicas: ora autoritária ora passiva, também fui mãe perdida e angustiada com os revezes.   Atordoada pelas dúvidas e erros, às vezes até grosseiros, retornava às opiniões alheias e depreciativas sobre o adolescente e o mundo de hoje para aliviar o peso de não saber o que fazer e como lidar com as novas circunstâncias exigidas.

Enquanto vestia a lente negativista e reducionista, jogava para baixo do tapete minha incompetente atuação de mãe e e a terceiros – fosse quem fosse – a responsabilidade dos maus resultados com filho.  Amparada pelas críticas ao adolescente de hoje, projetava nele – e no mundo – as mazelas das quais me ressentia de não saber conviver e lidar.

Apoiada em bengalas emocionais, resistia à atualidade olhando para um passado inexistente e, hoje, claramente ineficaz às necessidades atuais.  Desapercebidamente, ia também me enquadrando à uma categoria: a de pais de adolescente incompetentes ao mundo de hoje.

Pais de adolescente: compromisso com o mundo

Fui mãe despreparada e hoje me pergunto:  quem não é? Infelizmente, é uma premissa que costumo combater firmemente mas, confesso, sem argumentos capazes de mudar a condição.  Ainda. De fato, aprendemos a ser na prática, on the job, como dizia no meu trabalho no mundo corporativo.

Ingenuamente contagiada pelo desejo – e imagem – de ter filho, descobri um processo bem diferente na vida real e prática. Habituada aos ditados sobre a maternidade e, depois, adolescência, só compreendi a mensagem por trás dos comentários quando descobri que ter filho era muito mais do que a bucólica ideia de família: era missão – seríssima – de criar outro ser, de preferência melhor que eu, para o mundo.

Assim, a idílica ideia caiu por terra e logo se impôs dura, trabalhosa e inquietante. Se mãe me exigiu muito mais do que amor : me intimou ao compromisso de me esforçar eternamente em formar – e me tornar – a melhor versão de adulto para o mundo… hoje.

Perfil depreciativo de pais e filho adolescente de hoje

Não contava – tampouco desejava – ter de “aprender” a lidar com filho adolescente. Pelo contrário: esperava repetir fórmulas do passado que me poupassem esforços e entregassem resultados satisfatórios. Mas a vida real e prática de pais de hoje, junto com a extraordinária transformação do mundo e o novo perfil de adolescente de hoje, me cobrou atuação diferente.

Firmei batalha com filho adolescente de hoje e com o mundo. Entregue à ignorância – e consequentemente, desesperada –  me fechei em uma perspectiva sombria e sofri por não enxergar saídas.  Mãe em nova fase e era, senti gosto amargo do fruto que crescia independente de mim.

Sem saber como cuidar daquele valiosa e próspera semente de hoje, me rendi à lente perversa preponderante para justificar minha incompetente atuação em terreno diferente.  Inconscientemente, não só não ajudava como atrapalhava o natural desenvolvimento de semente e terrenos bons mas bem diferentes do que conhecia.

Adolescente de hoje no mundo de hoje

Com certeza conhece esta frase também. Talvez já a tenha também usado e, como muitos, até suspirado em tom tipicamente pesaroso de mãe que se ressente de “perder” filho para o mundo.  Porém, duvido que tenha atentado a outro – e a meu ver, real – significado da mensagem.

Criar filho para o mundo é muito mais do que olhar o próprio umbigo e se vangloriar – ou culpar – pelo desempenho. É, antes de tudo, prestar contas da imensa responsabilidade de dar bom fruto à sociedade e, consequentemente, à humanidade.

Mais do que um sentimento melancólico, a frase encerra em si sério compromisso de formar adulto saudável  – e para os mais exigentes, melhor –  para o mundo apesar e independente das circunstâncias vividas.

Pais agricultores

“Entregar” adulto ao mundo demanda esforço descomunal de agricultor incansável. Não obstante, a função impõe condições de contínuo aprimoramento.  Do contrário, a meta se perde e o esforço vira pó.  Talvez os erros cometidos nas novas tentativas tenham contribuído para o coro de duras críticas a pais e adolescente de hoje.  Já não sucumbo ou me curvo a elas. Em vez disso, assumo o protagonismo do cultivo.

Finalmente entendi que semear com ferramentas inadequadas ao hoje não me entrega o fruto esperado.  Preciso me atualizar pelo conhecimento e pela técnica para ganhar mais chance de sucesso no novo terreno e abraçar a missão consciente do esforço que me é exigido para não entregar fruto podre.

De fato, não domino mais o percurso; tampouco controlo filho adolescente como antes.  Mas, me esforço mais do que no passado porque hoje sei que a chance de o fruto “vingar” depende diretamente da minha capacidade de continuamente aprender e, junto com filho, crescer como mãe… no mundo de hoje.

Leituras correlacionadas: Legado para filho adolescente, O que você sabe sobre o adolescente de hoje para criticar?, Geração Canguru

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