Reaprendendo a empinar pipa com a violência de hoje
A violência de hoje me faz tremer não só pela falta de segurança mas também pela educação a ser dada a filho adolescente. Em plena fase de abertura para o mundo, de descobertas, de busca por autonomia, de transição para a vida adulta, me preocupa ter que saber dosar (ainda mais!) a liberdade que lhe dou para alçar vôo.
Cresci com senso de responsabilidade e autonomia que me deram a carcaça necessária para viver com independência e segurança. Espero o mesmo para meu filho. Não me lembro, porém, ter vivido tão alto grau de medo e insegurança como hoje. Mãe de adolescente em um mundo caótico e violento, tive que lidar com a nova variável da violência exacerbada para educá-lo.
Educar filho é como empinar pipa: preciso dar e puxar a linha para que voe e, de preferência, mantendo-se no alto. O ingrediente adicional da violência exagerada e descontrolada me deixa vulnerável a erros como, por exemplo, o de superprotegê-lo.
Recorro à minha própria experiência nas horas mais críticas de tomada de decisão e, confesso: ainda tenho muito o que aprender. Não tenho receitas prontas mas, uma das poucas certezas que tenho como mãe de adolescente é que quero formar um adulto independente e autônomo. Nem que prá isso, tenha que reaprender a empinar pipa com a nova variável do mundo atual: a violência.
Superproteção é uma cilada na educação do filho
Há quem defenda a idéia de que a violência sempre existiu, desde os primórdios da humanidade. Concordo e fatos históricos comprovam isso. Faz parte e evoluímos em nossas defesas e combates continuamente; com o tempo, aprimoramos nossa competência de defesa e, infelizmente, de agressão.
Hoje, porém, sinto um medo exagerado da violência que nos cerca. Rotineiramente somos bombardeados (sim, como em campos de batalha!) com notícias, situações, histórias de confronto e agressão que me levam a crer que o tempo da barbárie era assim.
A angústia de educar filho adolescente tendo que dosar o medo e a desesperança com o desejo de viver, de experimentar, de ousar me confunde e aflige. Nem por isso, quis cair na cilada de superproteger filho. Essa atitude não ajudaria a formar o adulto independente e autônomo que o mundo precisa; que ele precisa ser para viver.
A violência tornou a experiência de viver aterrorizante
Atento às notícias, aos relatos de amigos, a experiências de familiares, meu filho se tornou extremamente preocupado com a violência. Andar a pé ou de carro, no shopping ou nas ruas, pegar ônibus ou taxi, sair com amigos, ir a festas, tudo se tornou assustador demais prá ele:
– Não quero passar nessa rua de novo. Vai que o moleque que te assaltou está no sinal hoje?
– Não quero ir: vou ter que pegar metrô prá voltar… Não tô a fim de correr risco de confusão com tanta gente junta.
– Mãe, que saco!! Me busca, por favoooor! Não quero ficar em ponto de ônibus correndo o risco de ser assaltado!
Essas e tantas outras situações mostram o quão aterrorizante lhe parecia viver. Atividades básicas e rotineiras se tornaram um martírio que, sinceramente, entendia mas que não podiam se tornar um fantasma. Muito menos nesta fase em que o exercício de “dar linha” é tão crucial para dar-lhe confiança para ser independente e autônomo.
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Variável nova, recurso novo
Conheço e ouço pais que impedem filho adolescente de participar de várias atividades por conta do medo da violência. Escutar suas histórias me mostrou o quão inconsciente nos tornamos quando assumimos o caminho “mais fácil” de proibir filho adolescente de viver as experiências inerentes à fase por medo da violência.
Prestes a cair na cilada da superproteção, da superparalisia, do supermedo, acordei: teria que aprender a lidar com a violência exacerbada como uma nova variável do mundo atual. A responsabilidade de educar filho adolescente se tornou ainda mais desafiadora e assustadora… e continuava sendo minha.
Ciente da dinâmica pouco educadora de superproteger (e superafligir) filho adolescente. Assumi uma postura de precaução maior que a vivida em minha adolescência. Em vez de proibir, amedrontar ou paralisar, adotei a política de minimização de riscos como um recurso adicional na educação.
Passei a discutir as notícias de violência com clareza e racionalidade:
1- O que, por que, onde, sob que circunstâncias aconteceram?
2- O que e por que deu errado?
3- O que pode ser tentado de diferente como precaução?
E, principalmente: reforcei que a vida é exercício; é experiência que, por vezes, dá certo por outras, dá errado; que é mar aberto onde as ondas surgem inesperadamente. Que viver é experimentar, tentar, conseguir e não conseguir; é lidar cada vez mais com adversidades, inclusive as que vão surgindo com o tempo: como a violência de hoje.
Viver é um exercício de constante superação para pais e filhos
Manter latente a energia e a curiosidade pela vida em filho adolescente é desafiador em tempos de tanta violência. A responsabilidade pela formação de um adulto independente e autônomo não me fez sucumbir à tentação de superprotegê-lo mas de assumir a nova variável atual como um fato a ser trabalhado na minha função de mãe.
Ciente da importância de se viver a adolescência com experiências inerentes à fase, ajustei meu medo transformando-o em orientações práticas e racionais para minimizar riscos na tentativa de preservar sua adolescência com a vivência. Não tenho garantia de nada só a de que viver é um exercício de constante superação. Para pais e filhos adolescentes.
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