adolescência

Adolescência e a caricatura de mãe que não quero ser!

by Xila Damian

Enfrentar o turbilhão de mudanças físicas e emocionais com amor e paciência seria minha maior contribuição.

Fase difícil a adolescência, não? Prá mim, como mãe de adolescente começou bem difícil. Senti como que lançada em um quarto escuro onde as “regras do jogo” não valessem mais; como que, sem aviso prévio, meu filho adolescente fosse outra pessoa, diferente daquele que pensava conhecer.  Entramos na difícil fase sem saber o que estava por vir.  Até as frases típicas de mãe de adolescente fui capaz de adotar, o que me fez repensar o caminho que, sem perceber, estava trilhando.  Nada contra mães que nutrem o modelo “típico”;  só não era a caricatura que queria prá mim.

Que a adolescência exige muito de nossos filhos, não discuto.  São tantos desafios e questionamentos sobre sua identidade em desenvolvimento que não hesitei em passar pela fase junto com ele.  Enfrentar o turbilhão de mudanças físicas e emocionais com amor e paciência seria minha maior contribuição.  Não sabia, contudo, que o amor não bastaria. Junto com meu filho adolescente, também eu vivi meus próprios desafios e questionamentos… como mãe de adolescente.

Em Busca de Conhecimento

Lembro com ternura que, quando grávida, devorei informações sobre todas as etapas de desenvolvimento do meu bebê desde sua formação até o nascimento.  Com ele já em meus braços, continuei buscando ativamente dicas de como melhor lidar com aquele pequeno ser que naturalmente roubava toda a atenção da família e nos enchia de satisfação. O desejo de viver o momento e fazer o meu melhor naquele período eram a motivação que precisava para desempenhar papel tão desafiador.

Já naquela época, existiam inúmeros sites, livros e grupos de mães organizados para compartilhar experiências sobre a fase, uma forma de se sentirem mais seguras neste período de descobertas tão intenso.  Não foi diferente comigo e penso que, prá você, também não. Tamanho envolvimento só fez fortalecer o vínculo entre mãe e filho que, intuitivamente, passei a crer conhecer desde sempre.

O Prenúncio da adolescência

Foram muitos os alertas de mães de adolescente “experientes” sobre aquela que seria a “pior fase” do meu filho (ou da família?), segundo relatos de algumas. Frases como “você não viu nada!” e “espera prá ver quando chegar a adolescência” me pré-anunciavam uma era assustadora mas que, pelas minhas contas, ainda demoraria a chegar. Pensava:  “prá que me preocupar com isso agora?” Você certamente pensou o mesmo ou simplesmente deixou rolar até que ela simplesmente chegou, certo?

Pois os anos passaram (aliás, bem rápido) e a adolescência chegou. Tento lembrar quando me dei conta disso, mas não sei ao certo. Terá sido quando meu filho começou a argumentar sobre idéias que eu dava? Ou terá sido quando passou a retrucar minhas opiniões? Não, acho que foi quando sentiu o gostinho de me desafiar ou quando bateu o pé para ficar em casa sozinho. Não importa.  O fato é que, com a sua chegada, meu filho mudou. Eu também mudei… mais do que um dia pensei mudar.

Atordoada com a mudança repentina de comportamento, de atitudes e, consequentemente, de relacionamento busquei, de novo, fontes de informação que me ajudassem a desvendar também essa fase.  Desta vez, contudo, foi mais difícil porque, diferente da fase bucólica inicial, me deparei com mães aterrorizadas e resignadas da nova realidade de não saber lidar com filho adolescente.

Sou a caricatura de mãe de adolescente!

As premonições se confirmaram na adolescência: de fato, “não havia visto nada ainda”. Enquanto as competências iniciais de mãe são fundamentalmente físicas exigindo uma resistência quase que de atleta, as de mãe de adolescente são basicamente paciência e sabedoria.  Aprendi isso muito tempo depois…

O “quarto escuro” já havia me transformado na caricatura de mães “iguais”, de frases iguais e atitudes comuns. Havia perdido minha identidade e precisava recuperá-la em tempo de viver a adolescência junto com meu filho. Foi o suficiente para que eu metesse a cara e a mão na massa, por vezes, sozinha.

Lidar com filho adolescente ultrapassa qualquer idéia de desafio.  A sabedoria necessária para um convívio minimamente harmônico é conseguir dizer o que quer, fazer o que for devido e parar antes que o contato se transforme em um embate. Sim, porque adolescente não para; mas você sim.

Considerando os intensos (e por vezes explosivos) sentimentos controversos que eclodem nesta fase, calar-se na hora certa é uma estratégia de grande valia.  Não  raro, uma simples troca de palavras ou uma trivial pergunta gera uma explosão de mau-humor e discussões sem nexo, como essas por exemplo:

– Filho, já tomou banho hoje? pergunto.

Que saco, mãe!  Vou depois! retruca.

ou

– O jantar está na mesa! Vamos comer? convido.

– Caramba! Agora?? Tô no meio de uma conversa e você sempre aparece prá atrapalhar… Depois diz que só fico no computador, que não saio, não faço nada!

Que saco, mãe!

As situações saíam do controle facilmente e viravam discussão sem mais nem menos.  Mordia facilmente a isca de continuar aquele falso diálogo, dando margem a interações acaloradas que atingiam tom alto, irritado e irritante até descambar em ordens e reclamações de toda ordem: da desorganização do quarto, da falta de estudos, do banho não tomado, da hora que acorda, da que não acorda… Entre suspiros e muita discussão reclamava e reclamava.  Foi quando me reconheci a caricatura de mãe de adolescente.

Em retorno, meu filho adolescente soltava bufadas, me retrucava e, com viradas de olho, me desafiava com respostas enviesadas.  Não sabia ele que também havia se tornado uma caricatura… de filho adolescente.

O resultado disso foi um relacionamento cansativo, chato e desastroso; Um saco! para toda a família.  Sabia agora o porquê das lamúrias relatadas por aquelas mães do passado.

O alerta final chegou no dia que recebi do meu filho adolescente um desses vídeos que viralizam na internet.  Era a tal caricatura que, desenfreada e maravilhosamente bem interpretada, esbravejava frases típicas de mãe de adolescente: “engole o choro!”, “você não vai porque eu não quero!”, “não pode!”, ” leva o casaco, pode chover!”, “eu te disse, mas você é teimoso! Não me ouve!” para citar algumas delas. O detalhe foi o recado que veio encabeçando o vídeo: “olha você aí, mãe!”

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A caricatura perdeu a graça

Passada a graça da piada, a imagem daquela mãe passou a me incomodar a ponto de renegá-la: “Não sou assim. NÃO QUERO ser assim!” sentenciei.  Era o fim da caricatura e o começo da busca de minha identidade como mãe de adolescente.

Naquele instante, decidi que não passaria a fase da adolescência de meu filho como uma  espécie de “caricatura- espectadora”. Para lidar com ele, valeria o esforço de fazer a jornada junto dele e, sem hesitar, lutaria para me desvincular daquela imagem comum de mãe de adolescente que havia me tornado. Precisei mudar.

Tornei-me uma pesquisadora voraz e, como uma espécie de cientista dentro de casa, comecei a exercitar as descobertas sobre como lidar com meu filho adolescente.  Ao tomar ciência da mãe que queria ser, fiquei atenta às ciladas; elas não me pegariam mais.  Sim, porque é muito fácil enveredar pelo caminho comum, de frases comuns, de relação comum e cair no erro de aceitar a situação como também “comum” na fase da adolescência.

A maternidade consciente

Aquele vídeo (junto com o recado) foi o alerta da mãe que não queria ser para meu filho adolescente.  Ao tornar-me consciente do papel que queria desempenhar, corri em busca de construir o relacionamento que desejava ter com ele; abri mão de ser levada pelas circunstâncias e pelas caricaturas que não refletiam a mãe de adolescente que eu queria ser.

Conheci o conceito de “parentalidade consciente”  (Councious Parenting) que, ao defender a premissa de que filhos podem provocar profundas mudanças nos pais e que a criação do passado sob os moldes da hierarquia e do controle é ultrapassada, mergulhei nesse universo de descobertas.  Pude entender minha história e meus “gatilhos” responsáveis por, descontroladamente, gerar conflito;  aprendi a reconhecer a hora de interromper a interação.  Esta, especialmente, foi uma das dicas que mais me trouxe resultados:

Aprendi a não jogar pólvora em pavio aceso.

Longe de acertar todas, mas muito perto de acertar várias, assumi minha identidade e hoje sinto que, apesar das diferenças, vivemos a (difícil) fase da adolescência juntos, errando e acertando juntos, nos desenvolvendo juntos.  É um exercício contínuo e extenuante mas igualmente edificante, onde a caricatura de mãe de adolescente não ajuda em nada… só atrapalha.

Enganei-me ao crer que essa trajetória seria só dele; é nossa, é da família. Mas não se apavore porque, se compreendida e exercitada da forma correta, seguramente será um caminho de descobertas, onde o crescimento é mútuo e feito em parceria.  Esta, sim, é a melhor forma de lidar com a fase da adolescência.

Quanto à caricatura que esbraveja frases típicas de mãe de adolescente? Bem, tornou-se o que havia se proposto a ser desde o início: uma piada comum como tantas outras e da qual hoje rimos juntos lembrando a mãe de adolescente que um dia fui sem querer ser; e sem recado!

2 Comments

  • O que falo a filho adolescente fica, cresce e molda 18 de novembro de 2021 at 10:40

    […] Frustrada – e ofendida – de me sentir desconsiderada por filho adolescente, cansei de tentar me fazer escutar. Então cansada me tornei cansativa: mãe rabugenta e desrespeitosa com meu adolescente imaturo e inexperiente na arte de se comunicar.  Pouco a pouco personifiquei exatamente a enfadonha mãe que não desejava ser. […]

  • Sobre o uso de máscara: obedeço o novo normal mas não me conformo 17 de maio de 2020 at 14:29

    […] como pais de adolescente. MAIS AINDA agora, detrás de uma máscara. Leituras relacionadas:  Adolescência e a caricatura de mãe que não quero ser, Milagres a quem enxerga além da quarentena como educar filho adolescenteeducação na […]

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