sensação de pertencimento

Sensação de pertencimento: a busca começa na adolescência

by Xila Damian

Exercício profundo e corajoso

Descobrir o sofrimento de filho com baixa sensação de pertencimento na adolescência foi doloroso. Ainda que ciente dos conflitos internos vividos nessa fase, o impacto de ver filho sofrer com a experiência foi grande. A natural imaturidade do jovem, de fato, o deixa vulnerável a um vazio existencial doloroso e, por vezes, inevitável.

A adolescência é fase de natural distanciamento da família. Filho passa a pensar por si mesmo e a ter ideias próprias. Seu amadurecimento pressupõe afastamento de seu núcleo familiar e ingresso a novos grupos sociais. Os novos influenciadores, agora, o desafiam a formar sua identidade na pluralidade de opiniões e comportamentos, por vezes até dissonantes da educação ate então recebida.

Em tempo de praticar e testar o que absorveu em casa, descobre e vive novas experiências com o grupo ao qual pertence. Segue, assim, ampliando seu repertório e tentando formar sua identidade de acordo com suas expectativas nem sempre tão claras assim. Diante de tamanho desafio, sofre. Afinal, suprir a sensação de pertencimento é exercício profundo de autoconhecimento que começa cedo e demanda coragem pra descobrir sua essência.

Sensação de pertencimento nível zero

Depois de anos de trocas superficiais sobre seu grupo social, filho me surpreendeu com conversa séria: a sensação de pertencimento caíra a níveis muito baixos, baixíssimos. O relato de sua dissonância no grupo, mostrou um grande vazio existencial. Diferente do natural e até esperado conflito interno pelo qual adolescentes passam, era a angústia da tentativa frustrada de se ajustar que gritava bem diante de mim.

– Não aguento mais, mãe. Não tenho nada em comum com eles: nem nossos interesses são! Não gosto como se comportam nem vejo graça nas brincadeiras que fazem. – me confidenciou.

– Como assim, filho? Te via no grupo, os garotos me cumprimentam, conversam, te convidam pra festas… será que não é você quem está de birra com eles? – provoquei.

Com lágrimas nos olhos, respondeu:

– Não, mãe, saco!  Não sou nem quero ser como eles! Todo esses anos tentei me enquadrar, me forcei a seguir o grupo pensando que o problema era eu. Cheguei até a copiar alguns mas… não sou eu! Não me identifico com eles!  Por isso me afastei a ponto de nem ser mais convidado pra nada. Simplesmente desisti de tentar ser o que não sou. Por um lado foi bom, me sinto aliviado;  por outro lado, me sinto só, sem ter com quem conversar. Sinto falta de um amigo.

Enxergando o problema de frente

Repasso a situação com lágrimas nos olhos e dor no coração. Não só por relembrar o sofrimento estampado em seu rosto mas também por reviver minha culpa de ter relevado os sinais de sua insatisfação consigo mesmo. A baixa sensação de pertencimento lhe causava vazio existencial e tornava seu amadurecimento mais doloroso que o esperado.

A subsequente autopunição me invadiu: errei no diagnóstico. Não só quando induzia filho a se manter no grupo mesmo contra a vontade mas também quando o responsabilizava por se sentir diferente dos amigos.

A baixa auto estima seguida de notas baixas e isolamento davam sinais claros demais para eu me deixar enganar.  Na verdade, hoje creio que, por medo de não saber como ajudar, fingi não enxergar.

Agora, tanto quanto exposto, encarei o conflito de frente. Restava-me, então, saber mais do filho adolescente.

O pedido de ajuda

A sensação de pertencimento é necessidade de todos. À medida que amadurecemos (saudavelmente), descobrimos que a sensação de pertencimento não vem de fora, vem de dentro. A descoberta, quando saudável, vem a partir do autoconhecimento o que, infelizmente, é privilégio de poucos conscientes do exercício.

Na adolescência é onde tudo começa: o jovem em natural distanciamento de seu núcleo familiar, passa a explorar novas possibilidades em busca de sua identidade própria e única. Nessa jornada, agora observo filho e, quando preciso, oriento, tento ajuda-lo.

Diante de tamanho vazio existencial, me culpei. Enquanto o induzia a se ajustar ao grupo, renegava seus valores e sentimentos, o responsabilizava de se igualar e perder a forma natural e desejada, minava seu esforço em busca de sua identidade. Por todo esse tempo, cega e imune à sua luta individual de amadurecimento, minimizava seus conflitos internos.

O esforço silencioso e sofrido de tentar ser o que não era aumentava sua baixa autoestima enquanto diminuía sua sensação de pertencimento. Diante do insuportável dilema e profundo descontentamento consigo mesmo, pediu ajuda. E, dessa vez, não hesitaria em ajuda-lo a encontrar saídas.

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A identidade se formando de dentro

A maturidade precoce de olhar para si mesmo e escolher entre ajustar-se ao grupo ou seguir buscando o preenchimento de seu vazio interior fortaleceu a essência do meu filho. Escutar ativamente seus sentimentos, suas angústias, seus desconfortos me causou desconforto mas também trouxe importantes revelações: suas expectativas em relação ao mundo e a si mesmo.

A coragem de não mais se submeter a uma identidade distante de sua essência vem devolvendo gradualmente a autoconfiança ao meu filho pra ser quem é e, assim, buscar seu lugar no mundo. Quanto a mim, ganhei o grande aprendizado de observá-lo melhor para ajuda-lo a amadurecer seguro de sua identidade.

Finalmente, a insegurança e a dor vividas em busca da sensação de pertencimento transformaram não só filho mas mãe também. A essência de cada um parece, enfim, fluir delineando a identidade… desde cedo e de dentro.

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