momentos de solitude

Momentos de solitude: o que mães de adolescente não sabem

by Xila Damian

Momentos de solitude

Sabe o que significa “solitude”? Descobri ser “solidão” e logo o incorporei ao vocabulário por soar mais leve que seu sinônimo tão carregado de pessimismo. Na adolescência, gostava dos “momentos de solitude”. Porém, chamada de volta à agitação das rodas de amigos, me abdicava de vive-los com maior frequência.

Curiosamente, solidão é automaticamente associada à depressão. Cresci, então, cercada de gente, ocupada e agitada até quando meu desejo era estar só. Ainda que contrariada, me forçava a situações grupais pelo receio de parecer deprimida aos outros.

Hoje entendo a existência de estágios de depressão. Talvez por ter vivido alguns deles de perto mas fato é que estar só não é necessariamente ruim. Ouso dizer que é vital ao autoconhecimento e, consequentemente, ao crescimento de qualquer pessoa.

Viver momentos de solitude (disse que gostei da palavra!) me provou o que sentia desde cedo: não estou nem sou depressiva; estou conectada com minha essência. E isso, só consigo na quietude e tranquilidade dos momentos de solidão.

Oportunidades de vida

Cresci me esquivando e sendo desviada da solidão por desconhecimento. Contaminada por uma ideia limitada de depressão, buscava alento às minhas inquietações adolescentes então no grupo. Sem respostas, ia me igualando ao outro, me entorpecendo com a agitação da multidão.

Naturalmente, a agitada adolescência deu lugar à dinâmica maternidade que, por sua vez, foi ocupando espaços dos quais, depois, sentiria falta: minha identidade. Única e inigualável, me perdi dela em meio à vida corrida e agitada.  Estar só virou, então, objeto de desejo.

Na verdade, momentos de solitude são oportunidades. Estar só é condição propícia a descobertas e reencontros consigo mesmo e, acredite, isso é sempre bom. Assim re-signifiquei solidão e os momentos de solitude: em vez de morte podem ser grande oportunidade… de vida.

Eu indivíduo

O agito social era minha régua de vida: quanto mais cercada de pessoas, melhor. A quantidade sobressaía sobre a qualidade das relações, inclusive com filho adolescente. A medida de felicidade baseada em número de amigos crescia e o advento da tecnologia, cada vez mais, contribuía com minha fuga dos momentos de solitude.

Parar e refletir sobre si mesmo e a vida é mesmo exercício incômodo. Lidar com as inquietações e a desordem interna exige coragem pra encarar respostas às vezes duras sobre nós mesmos. Por isso entendo o medo, mas discordo da fuga.

Ainda que praticamente forçada pelas intempéries da vida, vivi momentos de solitude com certo prazer diria. Graças a eles, me (re)conheci. Não mais como mãe caricata de adolescente, executiva padrão, mulher modelo mas como indivíduo que se conhece o bastante pra viver de forma autêntica, sem rótulos, clichês e modelos. Sendo eu mesma.

Déjà vu adolescente

Pensava estar ajudando amiga quando lhe sugeri cultivar momentos de solitude. Quem sabe, assim, descobrindo o próprio “funcionamento”, seus gatilhos mentais e padrões de comportamento, encontraria caminhos melhores pra conviver com filho adolescente?

Entre ofendida e orgulhosa, reagiu:

– O quê? Nem pensar! Isso é coisa de deprimido! Essa não é a primeira nem será a última discussão com o Dani. A gente briga mas é assim mesmo: adolescente é tudo igual, ou seja, um saco! Só espero que a fase passe logo! Enquanto isso, vou é sair com os amigos pra esquecer e recobrar a energia desperdiçada com tanto bate boca.

Como em roteiro de um filme triste já visto, pensei: quão inconscientes somos de nos crermos completas quando nos tornamos mães de adolescente. Repetidamente caímos na cilada dos padrões negativos que tanto nos distanciam de filho e de nós mesmas.

Não enxergamos além. Invariavelmente, perdemos a identidade e absorvemos um perfil uniforme e “clicherizado” de mãe de adolescente. Desatentas, nos descuidamos e nos tornamos caricaturas de nós mesmas; pior: ainda rimos disso. Replicamos atitudes, opiniões e comportamentos alheios e simplesmente reagimos aos estímulos desencadeados por filho adolescente sem refletir sobre as causas de tantos deles.

Como um déjà vu adolescente, assumimos autossuficiência e onipotência pra não parar pra pensar sobre as inquietações que naturalmente nos são impostas. De novo, fugimos dos momentos de solitude por medo de quem queremos nos esconder: nós mesmas.

Exercício de quem transforma

Momentos de solitude me ensinaram escutar, observar e refletir sobre o mundo e a me perceber como indivíduo. Ao me (re)conhecer, finalmente entendi meus padrões de comportamento e gatilhos mentais, dados fundamentais que me tornam, de novo, dona da minha historia e me aprimoram como indivíduo consciente.

Viver momentos de solitude me permite encontrar caminhos próprios pra viver a fase de transformação do filho diferente da “massa”. Aprender sobre mim mesma me devolve a um universo maior e explica a importância de minha participação na formação de uma sociedade melhor que começa com um relacionamento consciente com filho.

Nesse feliz (re)encontro comigo mesma ganho autenticidade pra viver a adolescência de filho não mais seguindo a massa mas encontrando novos caminhos pra vive-la diferente do habitual. Não tento mais convencer aquela amiga a fazer o mesmo, mostro resultados. Estar só pode até nos soar “deprimente” mas é, sem dúvida, exercício revigorante de quem busca transformação; não só com filho adolescente mas com o mundo.

Aproveite nossa página do Facebook e compartilhe mais experiências: Clique aqui!

Leituras sugeridas:   Caricatura de mãe que não quero ser, Introspecção na adolescência, Pais em depressão, Quando relacionamento com filho adolescente cai no automático

1 Comment

Leave a Reply