Prática potencialmente danosa
Comparar filhos é prática comum. Desapercebidamente, caímos nessa cilada inconscientes dos potenciais danos que o hábito pode causar na personalidade de cada um. Por exemplo, convivi com irmãos, filhos de mesmo pai e mãe, que, criados sob mesmos critérios de educação eram totalmente diferentes um do outro.
As diferenças visíveis eram tão evidentes quantos as invisíveis. Enquanto um, louro de olhos verdes, era introspectivo e observador, o outro, moreno de olhos castanhos, era agitação e expansividade. Invariavelmente sofriam comparações e, chegada a adolescência, isso passou a incomodar.
Individualidades exaustivamente comparadas e rotuladas, os irmãos cresceram sob profundas rixas e desavenças só dissipadas depois de muita terapia na fase adulta. Com efeito, comparar filho pode deixar sequelas e contribuir com a formação de adultos emocionalmente doentes e inaptos para encontrar e assumir identidade própria; sem comparações.
Individualizar dá trabalho
Depois de grande superação, os irmãos parecem ter finalmente fechado o ciclo das comparações. Cada um, com suas características próprias, seguiu seu caminho curando as sequelas de uma história familiar cheia de comparações, a princípio, inofensivas. Hoje, mãe de dois adolescentes, já caí na cilada de também comparar filhos inofensivamente…
Ainda que fisicamente parecidos, vejo claramente as diferenças de cada um. Por isso mesmo, os comparo. Frequentemente, os encaixo em padrões mesmo quando nem sempre correspondentes à personalidade deles. Afinal, individualizar dá trabalho.
De fato, conviver com pessoas diferentes me cobra um serviço extra: sou forçada a ajustar comportamentos e atitudes pra me relacionar individualmente. Quando o filho é adolescente, aí sim, o exercício é ainda mais cansativo. Provavelmente porque, dadas as circunstâncias de viver intensas mudanças, sou forçada a lidar com filho diferente… todo dia.
O (mau) hábito
Costumava categorizar filhos como que traçando um paralelo entre eles:
– Aaahhh… um é introspectivo e objetivo; o outro, sensível e falante. São tãaao diferentes que nem parecem irmãos! – dizia.
Desapercebidamente, propagava uma imagem limitada dos dois. Ao comparar filhos, os rotulava sob uma lente binariamente dividida entre bom e ruim, certo e errado, melhor e pior. Invariavelmente, entregava perfil pronto, simplista e simplificador sem saber o muito que filhos ainda mudariam durante a vida.
Sob intenso processo de busca da própria identidade, filho era definido por minha lente materna e se ressentia de não se enxergar da mesma forma. Sem notar, privava filhos de se descobrirem indivíduos únicos; portanto, incomparáveis.
Certo dia, incomodado, o primeiro reclamou:
– Saco, mãe! Será que dá pra falar de mim sem comparar com ele? Outra: não sou como você fala. Por exemplo: sou até bem falante… você é que não sabe. Talvez porque não para pra me escutar.
Estupefata, me calei. Subitamente os irmãos vieram à mente.
A tentação de comparar filhos
Comparar filhos pode atrapalhar a formação da identidade do jovem que, em busca respostas, pode se ver forçado a assumir uma identidade que não é dele. Por isso, formar adultos autônomos e saudáveis demanda respeitar a individualidade de filho. Desde cedo… sempre.
Somos seres únicos. Assim também são filhos adolescentes. Carentes de individuação, massificá-los é priva-los de se descobrirem indivíduos independentes de irmãos e de comparações. Personaliza-los, portanto, é contribuir com formação de adulto singular e sobretudo, saudável.
Embora sob mesmos critérios e valores de educação, filhos adolescentes de mesmo pai e mãe, parecidos ou não entre si são, antes de tudo, indivíduos em busca de identidade própria. Sob contínuas e intensas mudanças, o jovem está em desenvolvimento; nada está definido. Por isso que, ao individualizar filho adolescente contribuo: lhe dou chance de ser o que e como quiser… neste momento.
Já sabia que comparar filhos poderia ser prejudicial à formação de adultos melhores. Nem por isso, escapei da cilada. Por sorte, o mais velho, revelado falastrão, me alertou em tempo de mudar; caso contrário, até hoje estaria comparando os dois. Irmãos e, ainda assim, tããão diferentes! É, pelo visto, vou ter que ficar ainda mais atenta: a tentação de comparar filhos continua grande.
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