Adolescente polêmico para um país de futuro
Já escutei muita história sobre adolescentes rebeldes. Quando perguntava o porquê daquela classificação, notava um certo engano de leitura: tratava-se de um adolescente polêmico, não rebelde como erroneamente se rotula.
Entender a diferença entre eles é fundamental: o polêmico discute opiniões divergentes e acaba suscitando debates (e não brigas!) de idéias. Bem diferente, portanto, do rebelde que pura e simplesmente vai contra tudo e todos sem argumentos. Só cria confusão.
Interessante notar como os polêmicos nos assustam à primeira vista. O susto nos faz taxá-los rapidamente como pessoas rebeldes, caso dos adolescentes, por exemplo. Quando aprendi a diferença e fugi dos rótulos, passei a gostar deles: são questionadores, curiosos, imanipuláveis.
Lembrei, por acaso, da campanha de uma famosa rede de TV que pergunta: “Que país você quer para o futuro?”. Taí: na minha lista de desejos de um futuro melhor, incluo o de contar com adolescentes polêmicos. Desde já!
Tomar as rédeas da própria vida é formar sua identidade
Passei pela “fase dos porquês” do meu filho um tanto cansada: seus constantes questionamentos em situações rotineiras me irritavam apesar de saber da importância daquela fase de desenvolvimento. Quando chegou a adolescência, quis achatar ainda mais sua curiosidade infantil tentando encaixá-lo nos moldes das respostas prontas e verdades absolutas.
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Perdia a chance de potencializar sua criatividade e senso crítico. Ironicamente, pagamos a conta quando nos tornamos adultos e somos exigidos a “pensar fora da caixa”, a desenvolver a criatividade e tantas outras habilidades abortadas na adolescência por uma imposição de modelos passados.
Fui adolescente tímida, de pouca voz. Sob a influência de uma mãe articulada, forte e presente, me escondi em sua sombra até que chegou o teste de sobrevivência: na faculdade, dividindo apartamento com outros jovens, precisei tomar as rédeas da minha vida, sair da sombra.
Foi um período de grande (e doloroso) amadurecimento. Descobri minha voz: aprendi a ter opinião própria, a discutir sob diferentes perspectivas, a defender pontos de vista divergentes. Aos poucos, fui me tornando uma adolescente polêmica, consciente de que não existem verdades absolutas.
Gostava daquela adolescente que surgia: questionadora e curiosa. Adulta, o gosto pelo conhecimento, pelas divergências construtivas, pelas discussões edificadoras, pelas opiniões diferentes só aumentaram. Ganhei uma identidade que permitia inúmeras possibilidades não mais um padrão único.
Agora mãe de adolescente, continuo aprendendo
Adolescente polêmico me instiga a curiosidade. Em uma sociedade livre e tão cheia de possibilidades, seria injusto limitar filho adolescente a seguir padrões dos quais discorda. Discutir (não é brigar, insisto!) as inúmeras opções de faculdade, carreira, estilo é ampliar horizontes e exercitar o respeito à diversidade.
– Mãe, que saco! Já disse que ir prá faculdade não é a única opção quando acabar o 3o. ano! Tenho outros planos e quero conversar com você sobre isso, mas sem estresse! Você precisa abrir a cabeça para escutar e entender antes de formar sua opinião ou dizer não. Ok?? – disse ele um dia.
Surpresa com tamanho argumento, recuei. Calei-me. Digerindo aquele desabafo, lembrei de minhas próprias escolhas do passado. Adolescente, precisei argumentar sobre as minhas escolhas; como as dele, também fugiram totalmente do padrão (e expectativa) da família e da sociedade.
Agora como mãe, precisava resgatar aquela “atitude aberta” do passado para ajudar filho a encontrar sua própria identidade. Não sabia que aprenderia ainda mais com ele.
Quero um país de adolescentes polêmicos
Quando descobri minha voz, descobri o prazer de poder escolher. Seguir padrões porque “devia” já não me convencia mais. Não se tratava de rebeldia mas de liberdade de escolha o que, por si só, não garantia nada. Precisava exercitar o livre arbítrio conhecendo, questionando, escutando e discutindo diferentes opiniões e idéias. Só assim podia crescer, amadurecer; sair da sombra.
Ler situações sob diferentes perspectivas, escutar opiniões divergentes da minha, discutir idéias, abrir a mente para novas possibilidades se tornou um caminho sem volta. Mas, quando me tornei mãe, aos poucos e sem notar, o medo da nova e desconhecida jornada que começava me levou de volta aos padrões.
Sacudida por aquele desabafo do filho, despertei. Eis o país que quero para o futuro: formado por adolescentes polêmicos capazes de aprimorar o mundo de hoje com sua energia e olhar crítico para considerar novas possibilidades.
As sacudidas fazem o país que quero para o futuro
Ao me deparar com aquele adolescente polêmico dentro de casa, resgatei o gosto pelo diferente. Junto, recuperei a capacidade de escutar e argumentar para poder orientar filho sobre possibilidades, não mais sobre padrões. O novo papel me fez reviver a adolescente polêmica do passado: não podia limitar meu filho em seu vôo.
Uma nação se faz com cidadãos conscientes, com voz ativa e senso crítico para escolher dentre inúmeras possibilidades. Desejo, portanto, manter-me suficientemente aberta para educar filho adolescente polêmico. Afinal, só com essas “sacudidas” terei chance de ver o país que quero para o futuro.
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